Entrevista com a vencedora da 6.ª edição do concurso Poesis, Paulina Dzięcioł

Em junho tivemos a oportunidade de bater um papo com a vencedora da 6.ª edição do concurso Poesis, o concurso de tradução de poesia organizado pelo Instituto de Estudos Ibéricos e Ibero-americanos da Universidade de Varsóvia e o leitorado do Camões I.P. nesta instituição. A conversa com Paulina Dzięcioł deu-nos a oportunidade de espiarmos os bastidores do processo da tradução da jovem tradutora.

Boa leitura!

* * *

Parabéns, Paulina, pela sua tradução. Conseguiu conquistar um júri composto por professores com anos de experiência em tradução que, pela sexta vez, meticulosamente avaliou vários poemas submetidos anonimamente. Quando você pôs o último ponto de exclamação, sentiu-se confiante?

Muito obrigada! Tenho de admitir que, ao terminar a tradução do poema, fiquei bastante feliz. A tradução foi um desafio, mas assim que descobri como “morder” correu bastante bem. Mas será que me senti confiante? Um pouco sim e um pouco não. Claro que pensei que seria bom ganhar, mas apercebi-me de que havia pessoas no concurso que eram muito mais fluentes em português e que eles já tinham alguma experiência de tradução.

Paulina, antes de tudo, conta-nos um pouco sobre como a língua portuguesa apareceu na sua vida e o que ela significa para você hoje.

Devo admitir que a língua portuguesa surgiu de forma inesperada. Estando no terceiro ano da minha primeira licenciatura (Estudos Latino-Americanos), numa das aulas à distância de uma disciplina sobre os descendentes de africanos na América Latina, tivemos a oportunidade de ouvir as histórias de duas pessoas do Brasil. Foi nessa altura que o português entrou na minha vida e decidi que iria recrutar para filologia portuguesa no ano seguinte. Não passou muito tempo desde então, embora o português seja agora uma “porta” para eu compreender as culturas, as comunidades e as histórias dos países de língua portuguesa.

O poema “Grito Negro” retrata a experiência negra e aborda questões históricas e culturais distantes da realidade da Polônia. Como você enfrentou esse desafio? 

É muito difícil, se não impossível, para nós (europeus) compreender as experiências dos negros, cuja história é constituída por escravidão, discriminação, racismo e, consequentemente, por uma imensidão de sofrimento. Penso que foi certamente útil para enfrentar esta tarefa o facto de ter concluído uma licenciatura em Estudos Latino-Americanos, em que muitas das disciplinas oferecidas abordavam a questão dos negros. Para além disso, a ajuda de todos os professores que lidam com este tema foi e continua a ser inestimável; os professores estão sempre disponíveis para ajudar : )

Em relação à pergunta anterior: o que lhe causou mais dificuldade na tradução do poema “Grito Negro”?

Achei muito difícil reproduzir as rimas e o melodicismo do texto. O poema “Grito Negro” não é lexicalmente complexo, mas a presença de rimas (especialmente nas palavras carvão – patrão, etc.) foi muito difícil de reproduzir em polaco. Além disso, um problema adicional para mim ao traduzir esta peça foi a tradução de “Patrão!”, uma vez que o polaco “Panie!” traz à mente uma referência a Deus em oração, em vez de uma relação de submissão.

Seja sua própria fã, seja sua própria hater: o que você mais valoriza na sua tradução e o que lhe deixa angustiada?

Estou contente por ter conseguido uma interpretação bastante interessante das rimas e da melodia do poema, que considero serem cruciais. Por outro lado, com esse tratamento, alguns dos versos tornaram-se mais longos, o que faz com que o texto não seja muito bom “visualmente”.

Eu diria que nem a estrutura e nem o léxico do poema são complicados em si, mas na hora de fazermos escolhas como tradutores, percebemos que há sutilezas, que há armadilhas. Talvez esta aparente simplicidade seja o verdadeiro desafio. Você poderia dizer algo a respeito das suas escolhas e refletir sobre elas também contrastando-as com as traduções de Wojciech Kupisz e de Marta Gburzyńska?

No caso deste poema, penso que todos tiveram de escolher: tentar transmitir a melodia à custa das palavras originais, ou aproximar-se lexicalmente do original à custa das rimas. Eu optei pela primeira opção porque, na minha opinião, transmitia melhor o carácter da peça. O Wojciech e a Marta, por outro lado, aproximaram-se melhor do original em termos lexicais, o que falhou na minha tradução. Já agora, parabéns aos vencedores!

Conhece bem a literatura dos Países Africanos de Língua Oficial Portuguesa? Tem autores ou livros preferidos? Conhecia a obra de José Craveirinha antes do concurso?

Sou estudante do segundo ano de licenciatura, então estou apenas a descobrir esta literatura. Curiosamente, o concurso coincidiu com uma aula em que estávamos a discutir a obra deste autor, por isso talvez tenha sido o destino…? : ) Em resposta à segunda pergunta, ainda não tenho nenhum autor preferido. Mas tudo pode mudar!

E se pudesse nos recomendar um escritor/uma escritora do mundo da língua portuguesa, quem seria e por quê?

Acho que posso recomendar o último livro que eu li, “O colecionador de almas sobradas”, de Eliane Brum. Trata-se de uma coletânea de reportagens que, na minha opinião, revela os Brasis (no plural!) dos quais não se fala muito. Brum escreve sobre situações extremamente difíceis, mas em cada uma delas é demonstrado otimismo.

Tem algum sonho enquanto tradutora? Qual foi a sua primeira tradução de português para polonês?

Ainda estou longe de ser uma tradutora, mas quando eu me tornar uma, nas minhas traduções tentarei captar o melhor “espírito” possível das obras, ter um vocabulário grande e fazer boas escolhas de tradução : D No entanto, a minha primeira tradução “a sério” foi mesmo esta, do poema “Grito Negro”. Por isso, acho que foi um bom começo: )

Julian Konopelski

* * *

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Top